Noite dessas, voltava da aula e
fiquei horrorizada com uma cena digna de trogloditas. Eu estava logo atrás de
um ônibus intermunicipal que transporta estudantes do interior para Campo
Grande e, um deles, ousou jogar pela janela uma lata de refrigerante. Estivesse
um metro a frente, a lata teria pegado no meu carro e, como se não bastasse a
lata descartada de forma errada e imoral, foi jogada também uma garrafa de água
pela janela do mesmo ônibus.
Terminei o caminho para casa pensando
que o problema da forma com que foi feita a licitação do lixo em Campo Grande
sem envolvimento efetivo da população e a preocupação com a forma com que o
lixo é descartado são problemas que chegaram ao topo de uma série de descasos
ao longo de 1500 anos de história.
Chega a ser tolice pensar que
alguém que não descarta o lixo no lugar correto irá se preocupar com uma
licitação cuja cessão de direitos de recolher o lixo vai durar 30 anos.
Em tempos de informação em
jornal, rádio, TV, internet, impossível um ser humano que diz estudante e se
abala lá do seu mundo – que julga pequeno demais para si e por isso vem estudar
aqui – não saber como descartar um lixo.
Dir-me-ão que o indivíduo –
chamo-o assim porque cidadão não é – que lançou seu lixo pela janela não é
daqui e não tem preocupação com o que acontece em nossa cidade. Respondo
dizendo que o problema não é onde se mora; é como em ações como a dele se
revela a conduta mesquinha das pessoas em relação ao cuidado com os bens
comuns. Sim, porque preservar o meio ambiente – bem comum – passa
necessariamente pelo modo como o lixo produzido é descartado.
Impressão positiva tive, porém, ouvindo
uma história sobre como os japoneses são cônscios de seus deveres como cidadãos
do mundo. Há muitos anos, um amigo estava fazendo um lanche em uma lanchonete
no Japão quando viu uma fila enorme de japoneses de cabelos vermelhos e azuis,
correntes penduradas por todos os lados, maquiagens pretas e roupas cheias de
caveiras. Ao verificar onde a fila ia dar, descobriu que era para o descarte
correto do lixo. Todos estavam com suas bandejas nas mãos; não iam somente
jogar tudo na lixeira, iam jogar cada lixo na lixeira específica para aquele
material.
Admirado, o expectador se
levantou antes de terminar seu lanche e foi tirar uma foto. Queria ter como
provar aqui no Brasil que sua história era verídica. Ao voltar a sua mesa, deparou-se
com um vazio. Alguém entendeu que a mesa vazia com uma bandeja significava que
tinham lanchado e ido embora. Pegou, então, a bandeja e se dirigiu à fila do
descarte de lixo. Aqui no Brasil, seria um assalto. Assalto de lanche!
A mesma atitude inconsequente do
estudante interiorano é vista também quando alguém resolve lavar a calçada de
sua caça, seu carro – e pasmem – até a rua em frente a casa com água limpa,
tratada. Pior que isso é que se alguém exigir que tal pessoa não use a água
dessa maneira, que para isso armazene água da chuva ou use a água descartada
pela máquina de lavar, ouve na melhor das hipóteses um mal-criado: “Tô pagando!
Na verdade, todos estão pagando!
Todos pagam pelo recolhimento ou não do lixo; todos pagam pelo lixo que não é
reciclado da forma correta, pois o fim do lixo mal descartado é a natureza e
ela cobra alto por tal audácia; todos pagam pela água desperdiçada; todos pagam
pela luz que milhares deixam acesa sem uso. Não é dinheiro do governo. É meu
dinheiro. É nosso dinheiro! O governante é só
alguém eleito para administrar nosso dinheiro como queremos. É eleito para
investir nosso dinheiro onde achamos que deve ser investido e, diga de
passagem, tão displicentes somos que nem para isso nos atentamos, pois em vez
de ele fazer exatamente o que queremos, faz o que bem entende... com dinheiro
alheio. É o meio mais fácil de enriquecimento!
Voltemos ao assunto principal.
Precisamos ter a cultura de respeitar os bens comuns, os direitos comuns. Não
podemos nos valer da mediocridade do “Não foi comigo!”, “Não me senti
ofendido!” ou, ainda pior, “Não sou eu quem está pagando!” Todos têm o dever
moral e o direito constitucional de se manifestar contra o uso abusivo ou
depredação de bens comuns até porque, mesmo que indiretamente, todos somos
afetados pelo mau uso desses bens.
E, lógico, não tem como ter essa
cultura se não houver verba – mais do que os 10% separados pelo prefeito de
Campo Grande para a educação ambiental. Povo evoluído, povo educado é povo que
tem bons administradores, preocupados com o desenvolvimento pessoal e moral de
cada cidadão. É isso que forma uma nação digna de ser chamada cidadã.
Mas, se as coisas continuarem como
estão, não demora muito e teremos de fechar o Brasil e ir embora. E deixar um
aviso bem vistoso: “O ÚLTIMO A SAIR, APAGUE A LUZ. PELO MENOS DESSA VEZ!”