Dia desses, fiquei admirada com o
tratamento que o Rolo recebeu. Há uns meses, seu dono foi impactado pela
notícia de que seu animalzinho estava com Leishmaniose, mas que poderia ser
submetido a tratamento que, por sua vez, trazia resultados satisfatórios.
Durante quatro meses, o Rolo ia ao veterinário fazer a quimioterapia e, depois
desse tempo, os exames do cãozinho anunciaram que ele não era mais transmissor da
doença e estava curado. Ainda assim, teria de repetir o exame de controle periodicamente.
Meses depois, o Rolo voltou a
ficar amuado. Andava mancando como se mal pudesse sustentar seu peso com as
patas traseiras. De volta ao veterinário, descobriu-se que a doença estava de
volta e que ele não suportaria novo tratamento. A única saída agora era o
sacrifício.
Primeiro, a injeção pra ele
dormir profundamente. Depois, os medicamentos que fariam a passagem sem dor,
pelo menos. Ainda assim, a família sofreu. Relutou. Repensou. Como aceitar a
eutanásia no bichinho que passou anos com a família? Que olhava para eles como
se entendesse o que falavam? Que os recebia na chegada e que se punha cabisbaixo
com sua partida?
Mas a saúde das crianças tinha
primazia sobre o pobre Rolo. E, então, lá foi o Rolo para o seu Calvário.
Apesar de toda a tristeza que
envolve os acontecimentos com o Rolo, ele teve não só durante a vida, mas
principalmente no seu fim um tratamento muito mais digno do que de muito ser
humano. Há, nesse mundão, pessoas que não têm nada de dignidade nem para viver,
nem para morrer. Vivas, perambulam por um deserto de miséria, de falta de água,
de alimento, de trabalho; ausência da vida que se chama humana. Mortas, são
largadas numa vala qualquer ou amontoadas como se fossem galhos podados que se
espera secarem. Alguém lhes tirou o direito de viver e de morrer como humanos.
Mas, mesmo em lugares
desenvolvidos, onde há recursos e desenvolvimento humano e social, há pessoas
que passaram pela doença e, por fim, pela morte embalados pela torpeza de
pessoas que acham que dispõem de vidas alheias. É o que, ironicamente,
aconteceu a pacientes do Hospital Evangélico de Curitiba. Ainda que a eutanásia
fosse permitida neste país, não poderia de modo algum acontecer como as
investigações apontam que a médica fazia. Não há relatos de que o paciente fica
inconsciente enquanto é escorraçado para o além. Aproveitar-se do fato de ele
estar profundamente debilitado e, por isso, não tem chance de se defender para,
então, empurrá-lo para a morte é tão covarde e criminoso que justo, parece-me,
seria pena de igual medida.
Concordo que é desumano ver um
ente querido que, pela doença, chegou ao fim; que a medicina atestou que, para
ele, não há mais jeito. Mas, ainda assim, se no Brasil a pessoa pudesse
requerer determinada conduta caso ficasse em estado vegetativo, mesmo que a
vida ou a morte por eutanásia dependesse tão somente de uma questão de foro
íntimo, jamais se admitiria que uma pessoa estranha ao paciente e ainda por
meios altamente questionáveis pudesse ter tamanha autonomia para, por vontade
própria, desligar o aparelho de que o paciente depende para respirar ou
aplicar-lhe remédio que causa paralisia muscular, reduz a fluxo de ar nos
pulmões e fatalmente o leva á morte.
Se até aos animais é dado morrer
dignamente quando gravemente doentes a ponto de pôr em risco a saúde do homem,
como se deve punir – se julgado culpado – alguém que se livrou de pessoas que lhe
confiaram suas vidas? Que sanção, apesar de não restabelecer o status quo, merece alguém que dispôs da
vida alheia como se dispõe de um objeto qualquer?
Haverá, no Brasil, a exata medida
que espelhe a justeza da pena merecida por conta de tal crime?
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